29.6.15

Gabinetes de Curiosidades

Gabinete C - Estrutura em Choupo, inclusão de 4 janelas e 2 postigos em pinho, cortinas em tecido de linho com números pintados, contendo pimentos seriados em pasta de faiança. Dimensões: A100 X L80 X P69 cm (1998)

Fotografias de Artur Henriques




















Gabinetes de Curiosidades de Sandra Casaca, inseriu-se numa exposição de finalistas, do Curso de Escultura da Faculdade de Belas Artes de Lisboa em 1999,"Quartos-Chambres-Zimmer-Rooms:Águas Correntes",surgindo como um condensar e mostra do seu projecto individual desenvolvido ao longo da sua passagem pela FBAUL (1993-1999). 

O Projecto tem como ponto de partida, a observação, prática e registo do desenvolvimento da flora - ciclo natural e agrícola.
Foram processos inerentes ao projecto, a recolha de elementos naturais e artificiais, cultivo, catalogação, registo fotográfico,desenho e a construção de gabinetes - dispositivos para observação dos mesmos. Na construção destes tiveram-se como preocupações eminentes, na utilização e reutilização dos materiais, o caracter ecológico e económico. Após a selecção dos espécimes vegetais a explorar, seguiram-se os estudos morfológicos e estruturais por processos cerâmicos. 


Desenhos e notas preliminares de Gabinete C































Fotografia de Artur Henriques
Estrutura em Choupo, gavetas em pinho com inclusão de puxadores em ferro,contendo elementos de recolha naturais e artificiais. Dimensões (A172 X L50 X P50 cm) (1997)


















"Há coisas, por exemplo materiais, desperdícios que acumulamos com uma intenção muito específica: de os vir utilizar para fazer qualquer coisa que ainda não sabemos o que é. Muitas vezes tanto acumulamos que nos esquecemos do que temos e nunca usamos para nada. Mas não deitamos fora. Ansiamos por essa utilização e regozijamos-nos quando ela se concretiza, porque, entretanto, fomos criando uma relação com aquela coisa.
 A acumulação de objectos começou por ser e é ainda hoje uma forma de sobrevivência."

Luísa Baeta, Excerto do texto "Gabinetes de Curiosidades", in Nove Meses Três Ciclos de Sandra Casaca, Ed. de Autor, Lisboa, 2001

Fotografia de Artur Henriques




gaveta #1











































gaveta #2


gaveta #3










































gaveta #4




















































gaveta #5





















































gaveta #6


























































Desenhos preliminares e notas - Gabinete A- 1995


"Finalistas de Belas Artes nos labirintos da criatividade"

"Diversidade coerente"
  "Concebendo a intervenção escultórica como um campo "em expansão"(Rosalind Krauss),numa territorialidade espacial, temporal e psicológica, sondando a própria arquitectura, por sua vez alargada a um papel estrutural, formal e social, "Águas Correntes" surge entretanto como uma pouco usual experiência onde a diversidade de propostas não obsta nenhuma coerência unitária.
  "Águas Correntes" forma assim um todo onde como escreve Giorgio Agamben a propósito dos "Gabinetes de Curiosidade" medievais ("L`Homme sans Contenu",Trad. franc., 1996) alguém se encarrega de reproduzir harmoniosamente o caos do macrocosmo animal, vegetal ou mineral, num conjunto em que cada objecto se lê por cotejamento com os outros. Efectivamente, aqui cada escultura se lê por individuação e mérito próprio (e em quase todas elas se detecta um propósito e uma tematização clara, ou uma pulsão para tal sem generalismos), num conjunto eficazmente coeso, seguindo-se o entendimento de que o carácter "expanded field" da escultura (refiro-me ao célebre texto de Krauss " Sculpture in the Expanded Field" de 1978), incorpora desde há algum tempo " agendas" de operação "proibidas" pelo classicismo, como complexidade - palavra-chave - da relação com a arquitectura, com o tempo e com a paisagem(no "earthwork").
  Rosalind Krauss começa a estudar estas mutações da escultura moderna desde a escrita com ambições didácticas, de " Passages in the Modern Sculpture" (MIT- Press, 1977). Criticando a especificidade disciplinar de um Greenberg, que remonta a Kant e a Lessing (século XVIII), como se sabe, Krauss pugna por uma escultura que se abre à temporalidade e à "experiência", então entendida fenomenologicamente para enquadrar-se na defesa do contexto minimalista, em superação do estrito constrangimento espacial.

As transformações da Escultura
  Embora o texto de Krauss esteja implicado na teorização de uma determinada época, a experiência fenomenológica é deveras interessante se neste momento for aplicada a "Águas Correntes", sobretudo por via da reconsideração do termo "experiência".
Depois de, genealogicamente, Krauss enfatizar o papel da Rodin como o criador do vocabulário da escultura moderna(onde a indefinição e a simultaneidade das dicotomias peso/flutuação, queda/ascenção, se valorizam por igual,em oposição à clássica sensação de definição e clareza de contornos), tal é colocado sob o signo da valorização da experiência.
  Assim: " E se o significado em lugar de anteceder a experiência, ocorrer na experiência?" Ou seja , e se a Escultura se despojar de toda a panóplia de obrigações miméticas e ilusionistas para, depois de conquistar auto-referencialidade (Rodin) se abrir à surpresa da "experiência"? - em cada momento e em cada lugar se diferenciando incessantemente.
  Este é um dos méritos mais evidentes desta proposta de alunos da FBAUL. Partiram além do mais de uma pulsão de ocupação de espaços, não normalizada, utilizando corredores (centrais ou outros), casas de banho e desvãos insuspeitos, pertença dos restos arquitectónicos do velho Convento de S.Francisco. A relação das obras com os locais também não estabeleceu nenhuma normalização, porque não obediente a qualquer cartilha de " site-specific", de primazia da efemeridade ( academizando a ideia de desmaterialização) ou outra.

"Gabinetes de Curiosidades"
  Neste contexto não haverá surpresa se começar a minha análise por "Gabinetes de Curiosidades" de Sandra Casaca. Temos uma intervenção numa sala de arquivo de documentação; local apropriado para uma renovada paráfrase do museu, concretamente para gizar um comentário, comum a toda a exposição, de oposição à homologação museológica (de que também nos fala Agamben, no mesmo capítulo do livro referido).
  O "programa" da autora, digamos assim, é o da diferenciação e inesperado da colecção de objectos recolhidos ou achados, o que pode ir ao ponto de, num recanto, fazer figurar um pequeno jardim. Crítica económica e ecológica(nas palavras da autora) a instalação ganha a sua pertinência ao alargar o seu comentário sobre o museu ao environment natural(cada vez mais simulado e petrificado) e às indústrias culturais(a razão económica)."

Carlos Vidal, Excerto de um artigo do jornal A Capital, "Finalistas de Belas Artes nos labirintos da criatividade", ArteHoje, 1999




























































































Gabinete E - Cortina em pano crú com texto impresso - Cântico do Irmão Sol de S. Francisco de Assis. Contendo cinco árvores: Acer palmatum, Gingko biloba, Bauwinia forficat, Cupressus sempervirens, Pinus pinaster(do pinhal de Leiria). 

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